Foi publicada, pelo Governo Federal, a Lei nº 13.988/20, que trata da transação no âmbito tributário. Tal mecanismo já estava previsto no Código Tributário Nacional (arts. 156, III e 171) e é uma das hipóteses de extinção do crédito tributário; Todavia, o tema ainda carecia de regulamentação e a lei em referência buscou exatamente ajustar esse instituto.
A transação é cabível para créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária – isso implica dizer que podem ser objeto desta as sanções administrativas e outros débitos junto ao Estado.
Diferentemente do parcelamento convencional, a transação é hipótese de negociação da dívida em que a Fazenda pode, observados os critérios da oportunidade e conveniência, acordar a regularização do montante, sempre em observância ao interesse público. Ou seja, a transação depende de aprovação e é ato discricionário do Fisco (o que não significa dizer que eventual recusa não deve ser devidamente motivada e fundamentada).
A transação poderá ocorrer através de três modalidades:
Proposta Individual ou Adesão | Débitos Inscritos em Dívida Ativa da União
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Adesão | Débitos discutidos administrativamente ou judicialmente |
Adesão de baixo valor | Para discussões (judiciais ou administrativas) de pequeno valor |
A proposta de transação deverá vir acompanhada de algumas contrapartidas por parte do devedor de (i) não utilizá-la de forma abusiva; (ii) não fazer uso de interposição fraudulenta de terceiros, pessoa física ou jurídica (“laranjas”); (iii) não alienar bens ou direitos sem prévia comunicação à Fazenda; (iv) confissão da dívida, com desistência de eventuais recursos ou ações judiciais.
Caso a transação envolva o pagamento parcelado, a extinção da dívida ocorrerá somente após a quitação integral do montante transigido, ficando, até lá, suspensa a exigibilidade do crédito tributário.
Ocorrerá a rescisão da transação em casos de: (a) descumprimento dos termos do acordo; (b) atos de esvaziamento patrimonial (ainda que ocorrido antes da transação); (c) vícios na formalização do acordo (prevaricação, concussão ou corrupção passiva dos agentes públicos envolvidos); (d) dolo ou fraude na formação da transação; (e) infringência de outras regras previstas no acordo de transação; (f) inobservância de qualquer das regras contidas na Lei 13.988/20.
A lei veda a realização da transação nas seguintes hipóteses:
- Redução de multas de natureza penal/punitiva;
- Que preveja descontos para débitos do Simples Nacional (até que sobrevenha lei nesse sentido);
- FGTS (enquanto não houver autorização do Conselho Curador do FGTS);
- Envolva devedor contumaz (conforme definido em lei específica).
A adesão ou proposta de transação não autoriza a “restituição ou a compensação de importâncias pagas, compensadas ou incluídas em parcelamentos pelos quais tenham optado antes da celebração do respectivo termo”. Em outras palavras: caso o débito transacionado tenha sido objeto de parcelamento anterior, a legislação não autoriza a compensação dos valores pagos anteriormente no abatimento da dívida.
Caberá à norma que regulamentar a transação prever um valor máximo para que estas sejam feitas sem a necessidade de chancela do Ministério da Economia. Fica também autorizado ao Fisco a possibilidade de recusa, caso isso implique em prejuízo ao orçamento e as finanças públicas.
A lei também prevê limites objetivos para a formalização da transação:
- Os descontos só podem ser relativos às multas, juros e encargos legais para débitos classificados como “irrecuperáveis ou de difícil recuperação”, desde que não implique a redução em mais de 50% do valor total da dívida (que pode ser de no máximo 70% para pessoa física, microempresa ou empresa de pequeno porte);
- Podem ser concedidos prazos especiais de pagamento, incluindo o diferimento e moratória, desde que não ultrapasse o limite de 84 meses (que pode ser de no máximo 1475 meses para pessoa física, microempresa ou empresa de pequeno porte);
- Substituição, oferta ou alienação de bens para garantia do acordo; Tais garantias podem ser de qualquer modalidade, inclusive créditos do contribuinte reconhecidos judicialmente em desfavor da União
- Não pode envolver débitos não inscritos em dívida ativa (exceto aqueles cuja cobrança fique à cargo da Procuradoria-Geral da União.
A lei também define como débitos de difícil recuperação aqueles que tenham como devedor empresas em recuperação judicial ou falência.
A transação não suspende, automaticamente, o curso das respectivas ações que visem a cobrança de tais débitos, porém, as partes podem convencionar a suspensão do processo no respectivo termo.
A lei também prevê a transação (na modalidade “por adesão”) para casos específicos que girem em torno de relevante controvérsia jurídica, a fim de solucionar “questões tributárias que ultrapassem os interesses subjetivos da causa”.
Igualmente, a legislação traz a transação “por adesão” para débitos do chamado “contencioso de pequeno valor”, assim entendidos débitos cujo valor não supere 60 (sessenta) salários mínimos. Com a definição legal do contencioso de pequeno valor, também restou limitado o acesso ao CARF (segunda instância administrativa), de modo que as transações envolvendo tal quantia, ficarão restritas ao julgamento definitivo (no âmbito administrativo) pela Delegacia Tributária de Julgamento.
A PGFN já editou Portaria regulamentando o tema (Portaria 9.917/20), a qual trouxe algumas previsões que, ao que parecem, vão contra o espírito da lei; como a limitação para pagamento parcelado de contribuições previdenciárias para no máximo 60 parcelas e a vedação para acordo apenas em relação a uma única inscrição (exigindo, para tanto, a comprovação de impossibilidade financeira da empresa em transigir todas as inscrições por ventura existentes).
A Portaria também prevê critérios para mensurar a capacidade econômica do contribuinte, que poderão resultar nas classificações da dívida da seguinte forma:
“I – créditos tipo A: créditos com alta perspectiva de recuperação;
II – créditos tipo B: créditos com média perspectiva de recuperação;
III – créditos tipo C: créditos considerados de difícil recuperação;
IV – créditos tipo D: créditos considerados irrecuperáveis.”
A classificação utilizará os seguintes dados para determinação do risco:
“a) receita bruta e demais informações declaradas na Escrituração Contábil Fiscal (ECF);
- b) receita bruta e demais informações declaradas na Escrituração Fiscal Digital da contribuição para o PIS/PASEP, COFINS e Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (EFD-Contribuições);
- c) informações declaradas na Escrituração Fiscal Digital de Retenções e Outras Informações Fiscais (EFD-Reinf);
- d) valores registrados em Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e) de entrada e de saída;
- e) informações declaradas ao Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial);
- f) informações declaradas no Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (PGDAS) e na Declaração de Informações Socioeconômicas e Fiscais (DEFIS);
- g) massa salarial declarada nas Guias de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP);
- h) débitos declarados nas Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF);
- i) valores de rendimentos pagos ao devedor e declarados por terceiros em Declarações de Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (DIRF).”
Os débitos também serão classificados como irrecuperáveis nas seguintes hipóteses:
“I – inscritos há mais de 15 (quinze) anos e sem anotação atual de garantia ou suspensão de exigibilidade;
II – com exigibilidade suspensa por decisão judicial, nos termos do art. 151, IV ou V, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, há mais de 10 (dez) anos;
III – de titularidade de devedores:
- a) falidos;
- b) em recuperação judicial ou extrajudicial;
- c) em liquidação judicial;
- d) em intervenção ou liquidação extrajudicial.
IV – de titularidade de devedores pessoa jurídica cuja situação cadastral no CNPJ seja:
- a) baixado por inaptidão;
- b) baixado por inexistência de fato;
- c) baixado por omissão contumaz;
- d) baixado por encerramento da falência;
- e) baixado pelo encerramento da liquidação judicial;
- f) baixado pelo encerramento da liquidação;
- g) inapto por localização desconhecida;
- h) inapto por inexistência de fato;
- i) inapto omisso e não localização;
- j) inapto por omissão contumaz;
- k) inapto por omissão de declarações;
- l) suspenso por inexistência de fato.
V – de titularidade de devedores pessoa física com indicativo de óbito.
VI – os respectivos processos de execução fiscal estiverem arquivados com fundamento no art. 40 da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, há mais de 3 (três) anos.
Parágrafo único. As situações descritas nos incisos III, IV e V do caput deste artigo devem constar, respectivamente, nas bases do CNPJ e do CPF perante a Secretaria-Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia até a data da proposta de transação, cabendo ao devedor as medidas necessárias à efetivação dos registros.”
A lei trata também da possibilidade de transação envolvendo créditos do devedor junto à administração pública, inclusive precatórios (próprios ou de terceiros), desde que haja a adesão à alguma modalidade de transação (por adesão ou individual) e com respectivo pagamento da entrada, podendo o crédito ser utilizado no abatimento ou quitação do remanescente.
Transação Extraordinária
Em razão da pandemia decorrente do coronavírus, a PGFN também editou a Portaria 9.924/20, que autoriza a negociação na modalidade “por adesão”, para débitos dos contribuintes mediante entrada de 1% do valor da dívida (parcelado em até 3 vezes) e o saldo em até 81 parcelas e 142 parcelas para pessoa física, microempresa, empresas individuais, empresas de pequeno porte ou instituições de ensino.
Prazo para adesão: 30 de junho.
Adesão às modalidades de transação pela internet
Para aderir a alguma das propostas de transação por adesão (Edital nº 01/2019 ou transação extraordinária), o contribuinte deverá acessar o portal REGULARIZE e selecionar o serviço “Negociação de dívida” > “Acessar o SISPAR” > clicar no menu “Adesão” > opção “Transação”.
Quem já teve o débito parcelado também poderá aderir. No entanto, o contribuinte que tem parcelamento em vigor deverá solicitar a sua desistência. A desistência de parcelamento está disponível no portal REGULARIZE. Acesse as orientações ou o vídeo com o passo a passo e saiba como proceder.
Quanto às propostas individuais da transação, o contribuinte deverá apresentar o pedido perante os canais de atendimento remoto da PGFN.
Fonte site da PGFN:
Revisão de Texto – Colaboração:
Isabela Porini Ribeiro
Estagiária do Escritório Ribeiro & Albuquerque – Advogados Associados