Autor: Cristina Cloches – Analista Financeira do escritório Ribeiro & Albuquerque Advogados.
Diversos movimentos normativos e regulatórios têm aproximado o Brasil de práticas financeiras internacionais e a expectativa é que esses movimentos venham acompanhados de mudanças expressivas no setor econômico.
É o caso por exemplo do projeto de lei que tramita no senado e que diz respeito a uma nova lei cambial. A PL 5387/19 que teve sua votação concluída na câmara dos deputados está causando grande expectativa no mercado financeiro e a esperança é que possa entrar em vigor ainda esse ano.
O projeto foi elaborado em conjunto entre congressistas, Banco Central, Receita Federal e fintechs além da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A ideia é repaginar uma legislação antiga que dita as regras sobre a moeda corrente do país.
Entre as principais mudanças, destaca-se a possibilidade de compra e venda direta de moeda entre pessoas físicas. Hoje qualquer transação que seja realizada fora de bancos ou corretoras habilitadas, é considerada ilegal. A nova legislação prevê a possibilidade de negociação de até quinhentos dólares de forma informal, entre pessoas físicas, sem que seja considerada irregular e, consequentemente sem necessidade de registro ou declaração. A princípio, o texto original previa um montante de mil dólares, mas a versão final aprovada pela câmara reduziu o valor pela metade.
Outra mudança bastante comentada é a flexibilização de operações que envolvam câmbio para outros países e emissão de cartões internacionais através de fintechs e empresas de menor porte. A expectativa é que essa mudança abra o mercado para uma enorme variedade de concorrentes, possibilitando que essas empresas estejam em pé de igualdade com grandes bancos e empresas cambiais.
Além disso, o projeto prevê ainda uma alteração no que diz respeito à valores trazidos por passageiros que estejam indo ou voltando de viagens internacionais e sua declaração perante a Receita Federal. Atualmente, viajantes que possuem valor em espécie superior a dez mil reais devem declarar a quantia perante a Receita, mas, caso a lei seja aprovada, a quantia mínima passa a ser de dez mil dólares, ou seja, o equivalente a pelo menos cinquenta mil reais se levarmos em consideração a cotação atual do dólar.
Para o investidor brasileiro, a promessa é de um novo ambiente regulatório, com menos burocracia e maior simplificação. Empresas brasileiras poderão ter conta em real em bancos no exterior, o que influencia nos acordos multilaterais, como o Mercosul, onde o real já possui forte utilização. Assim, as mudanças anunciadas vislumbram a inserção do país em cadeias globais que operam em dólar.
O texto também possibilita a simplificação na entrada de recursos no país para investimentos estrangeiros em ativos como ações e títulos. Isso impacta na redução dos requerimentos e estimula novas oportunidades de investimentos no Brasil.
Apesar das propostas ousadas e da grande expectativa a PL acabou gerando certa frustração em um dos assuntos mais aguardados: a possibilidade de criação de contas em dólar.
Muitas empresas e pessoas do ramo financeiro estavam na expectativa de que o projeto trouxesse a possibilidade de pessoas físicas e jurídicas poderem abrir contas em dólar (principalmente por se tratar de algo que já vem acontecendo em vários países, inclusive os subdesenvolvidos). Contudo, o texto delega essa decisão para o Banco Central que, ao ser questionado pela CNN Brasil, declarou que não pretende permitir tal ato tão cedo. A verdade é que esse assunto causa certo receio em meio aos especialistas que temem que tal prática abra precedentes para que o Brasil passe a ter o dólar como uma moeda paralela, como é o caso da Argentina ou do México, por exemplo, enfraquecendo assim o real.
Entre expectativas e frustrações, é preciso admitir que, em mais de 40 anos no mercado de câmbio, essa é a primeira vez que um projeto tem o potencial de alçar o Brasil a um novo patamar nesse segmento, com a possibilidade de desenvolvimento não só de uma parcela de empresas, mas das pessoas e da economia do País, como um todo.