O presente artigo visa trazer breves observações acerca da ilegalidade na reprodução, sem critérios de ações judiciais distribuídas; procedimento este adotado pelos órgãos de proteção ao crédito sem que antes sejam observados critérios mínimos para que a informação não atrapalhe a atividade ou cotidiano da empresa/pessoa física
Mencionados cadastros são regulados pelo art. 43 ss do Código de Defesa do Consumidor. Semelhantemente, a Lei nº 12.414/2011 trata a respeito do chamado cadastro positivo, cuja norma traz conceitos importantes acerca da qualidade das informações tornadas públicas de pessoas físicas e jurídicas (diferente do cadastro negativo, que não trata desse ponto de igual importância).
Referidas anotações dizem respeito a processos que muitas das vezes não deveriam ser listados como restrições, ainda que por mera reprodução de processo judicial.
Importante frisar que o avanço tecnológico e informatização dos tribunais, já é possível saber não só a existência dos processos mas também sua situação atual (fase instrutória, sentença, recursal etc…).
Se de um lado existe o princípio da publicidade dos atos judiciais (art. 8º, CPC[1] e art. 5º, LX da CF/88[2]) , com exceção dos casos que tramitem em segredo de justiça, do outro também existe a liberdade econômica que garante ao empresário sua atuação sem interferência ilegal do Estado (art. 170, § único, CF/88[3]). Afinal, a empresa desenvolve um papel importante na sociedade, seja na geração de riqueza, seja na criação de empregos.
Além disso, a existência de informação incompleta e imprecisa nas mencionadas anotações, resulta na inobservância dos parâmetros definidos no art. 3º da Lei nº 12.414/11 (aplicada por analogia ao caso, posto também tratar de cadastro público) ao prever que “Para a formação do banco de dados, somente poderão ser armazenadas informações objetivas, claras, verdadeiras e de fácil compreensão, que sejam necessárias para avaliar a situação econômica do cadastrado”.
Ou seja, a anotação deve observar certo nível de qualidade da informação: objetiva, clara, verdadeira e de fácil compreensão.
Se para o cadastro positivo deve ser observada a necessidade de que as informações sejam claras para avaliar a situação econômica do cadastrado – igual critério deve ser utilizado para o cadastro negativo aqui em discussão, posto que seus efeitos geram consequências negativas.
A simples menção à existência de processo em tramitação não indica a real (verdadeira) situação daquilo que motivou a anotação.
Se os sistemas de proteção ao crédito são avançados tecnologicamente a ponto de obter a imediata informação a respeito da existência do processo, também deve ser para realizar as devidas complementações das informações, especialmente no âmbito tributário onde é corriqueira a realização de parcelamentos com longa extensão até quitação final.
As informações lançada, muitas das vezes de forma irresponsável e ineficiente, não são objetivas nos termos da lei, pois não descrevem fatos e apenas torna pública a existência de ação em tramitação.
Imaginemos a situação em que um suposto credor promove cobrança de dívida prescrita; ainda assim a informação é disponibilizada, fazendo com que o empresário tenha de se explicar toda vez que ocorra alguma consulta ao referido banco de dados.
A problemática reside também no fato de que muitos bancos, fornecedores e instituições financeiras não estarem familiarizados com tais situações, fazendo com que uma análise superficial e não aprofundada do crédito, resulte na recusa em razão de anotações equivocadas.
O §3º do art. 43 do CDC prevê que o Consumidor pode exigir a correção de informações inexatas, porém, muitas das vezes mesmo após devidamente notificada, não ocorrem os devidos ajustes.
Vale frisar que tal recusa é crime tipificado pelo CDC, nos termos do art. 72[4] da referida norma, evidenciando a gravidade da conduta omissiva. Também é considerada infração penal a conduta de deixar de ser averbada a devida correção da informação incompleta existente (art. 73, CDC[5]).
Outra irregularidade na conduta dos órgãos reside no fato de que tais anotações não são previamente comunicadas, visto que foram automaticamente inseridas nos sistemas após leitura automática dos diários.
Tal expediente afronta o quanto determinado no art. 43, §2º do CDC, que prevê a necessidade de comunicação prévia e por escrito da anotação, sob pena de nulidade (Súmula 359-STJ “Cabe ao órgão mantenedor do cadastro de proteção ao crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição”). Nesse sentido:
“A inobservância da norma inserta no art. 43, §2º, do CDC por parte da entidade responsável pela manutenção do cadastro de inadimplentes enseja danos morais ao consumidor que tem o nome inscrito em tal circunstância.” (STJ, RESP 773871/RS, Rel. MIn. César Asfor Rocha, DJ 13/03/06)
“A inscrição do nome do devedor no cadastro do Serasa deve ser precedida da comunicação exigida no art. 43, §2º do Código de Defesa do Consumidor. O interstício de mais de dois anos entre a inscrição do nome no Serasa e a posterior notificação judicial ao devedor, além de não ser razoável, não afasta o constrangimento que advém da inscrição, notadamente se esta for indevida, tornando cabível a indenização por dano moral. (STJ, RESP 373219/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 12/08/2002)
Importante frisar que não se busca aqui questionar a possibilidade de serem replicados dados de processos judiciais existentes, porém, há que se conferir ao consumidor, o direito de que a informação seja a mais prudente, clara e precisa, a fim de evitar que apenas a informação prejudicial seja divulgada (existência de processo), sem que conste averbado os atos posteriores que indiquem pela improcedência ou suspensão do processo judicial.
Isso porque a consulta aos sistemas dos processos judiciais possibilita, em simples leitura, identificar o status do processo (existência de sentença, acordo etc…); por conta disso, a reprodução de tais informações nos cadastros do SPC e Serasa não pode se dar de forma simplória pois pode resultar em prejuízos irreparáveis.
Nesse cenário, entende-se perfeitamente o pleito em juízo de ordem judicial que obrigue os órgãos de proteção ao crédito a promover a devida complementação das informações tornadas públicas a respeito de processos judiciais.
[1] Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
[2] “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[….]
LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;”
[3] “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[…]
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”
[4] “Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros:
Pena Detenção de seis meses a um ano ou multa.”
[5] Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata:
Pena Detenção de um a seis meses ou multa.