Como amplamente comentado e demonstrado, a crise econômica provocada pela pandemia do COVID-9 atinge os mais diversos setores, impactando severamente as relações contratuais celebradas antes de seu surgimento, uma vez que muitas pessoas, físicas e jurídicas, têm encontrado dificuldades no cumprimento de suas obrigações.

Contudo, diante deste cenário imprevisível à todos, é importante destacar que há em nosso ordenamento jurídico institutos desenvolvidos justamente para regular demandas desta natureza, como, por exemplo, a teoria da imprevisão, caso fortuito e força maior, a onerosidade excessiva e, ainda, um dos princípios norteadores das relações contratuais: o princípio da boa fé.

Tais institutos permitem (a depender das circunstâncias de cada caso), a revisão do valor das prestações contratuais, pois, levam em consideração a alteração decorrente de evento superveniente das circunstâncias contratuais.

Com base em tais regras de Direito, o escritório Ribeiro & Albuquerque obteve liminar favorável nos autos da ação denº 1031846-14.2020.8.26.0100 em trâmite na 15ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo/ SP, que trata a respeito da necessidade de renegociação e aplicação das cláusulas contratuais diante de um evento de força maior de forma especial e flexível.

Em suma, o requerente deste caso, ao ter rescindido um contrato de locação antes da decretação de medida de quarentena no Estado de São Paulo, mediante solicitação do locador, se viu obrigado a devolver o imóvel sem as benfeitorias realizadas (no estado em que havia recebido o bem).

O prazo para entrega do imóvel que estava previsto para a primeira semana de abril de 2020 restou prejudicado diante da decretação de quarentena e paralisação de diversas atividades no Estado de São Paulo. O locatário, então requerente, se viu sendo excessivamente onerado diante dos gastos com as obras para retirada das benfeitorias e, considerando o atraso na entrega do imóvel, restou ainda a incidência de mais um aluguel, sem contar no caixa reduzido consequente da decretação de quarentena, uma vez que atua no ramo de eventos.

Mesmo após várias tentativas de solução amigável ao tema, não foi possível sanar a questão extrajudicialmente.

Neste cenário, foi ajuizado pedido de liminar requerendo a suspensão da incidência dos aluguéis dos meses de março e abril de 2020 e até que fosse revogado o estado de calamidade pública, pedido fundamentado na teoria da imprevisão, caso fortuito e de força maior,  onerosidade excessiva e, ainda, pelo princípio da boa fé .

O pedido foi concedido em decisão liminar que determinou a suspensão da exigibilidade dos aluguéis de março, abril e maio de 2020, com possibilidade de prorrogação. 

A decisão foi fundamentada no princípio da boa fé contratual previsto nos artigos 113 e 422 do Código Civil, na função social dos contratos prevista no artigo 421 do mesmo Código e, ainda, na vedação ao exercício abusivo de direitos com previsão no artigo 187 também do Código Civil. Segue trecho da decisão fundamentando o dever de renegociação dos contratos:

“Diante do cenário de crise sanitária e econômica em que o país se encontra, a renegociação de contratos deixa de ser uma mera faculdade para se tornar um dever, com previsão no Código Civil, que estabelece o princípio da boa-fé contratual (arts. 113 e 422) e da função social dos contratos (art. 421) como norteadores dos negócios jurídicos privados. Incide também em situações como a presente a vedação ao exercício abusivo de direitos, com previsão no artigo 187 do Código Civil, segundo o qual “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. “

Cabe destacar que a orientação inicial segue sendo uma composição extrajudicial entre as partes, embasada no dever de renegociação contratual diante de um evento de força maior, considerando as circunstâncias específicas de cada contrato.

Contudo, uma vez infrutífera qualquer composição extrajudicial, como demonstrado, nosso ordenamento jurídico prevê institutos que objetivam regular tais relações.

Em aproveitamento ao tema, outra questão importante a ser destacada, diz respeito aos contratos celebrados durante a pandemia do COVID-19, ou seja, já com conhecimento de seus efeitos, ainda que imprevisível seus desdobramentos. É de suma importância que tais contratos sejam redigidos já prevendo os desdobramentos da pandemia com as possíveis alterações nas condições acordadas. Isso porque, diante do conhecimento dos fatos, os fundamentos para solicitação de posterior revisão contratual aqui elencados, se mostram fragilizados.

Por fim, destaca-se que cada caso deve ser analisado com base em suas particularidades.

Consulte aqui a Liminar concedida.

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