Uma recente tese vem sendo amplamente discutida no âmbito trabalhista, a respeito da possibilidade de que caberia ao Poder Público o pagamento de verbas rescisória, com fundamento no artigo 486 da CLT, que assim dispõe: 

Art. 486-  No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.  

Apesar da adoção do Fato do príncipe estar sendo amplamente divulgada e incentivada, inclusive pelo Presidente da República, há de se ter cautela.

Primeiramente, é preciso destacar que o artigo 486 da CLT dispõe sobre pagamento da indenização, não se referindo às verbas rescisórias diretamente. Sendo assim, não se sabe qual a interpretação será dada pelos magistrados em eventuais reclamatórias trabalhistas. 

Os juristas se dividem em 03 correntes quanto a aplicação do “Fato do Príncipe” ou “factum principis” . Vejamos: 

Parte da doutrina, mais conservadora, não vislumbra a aplicabilidade do art  486 da CLT no contexto atual, vez que o risco da atividade empresarial é do próprio empregador, não podendo a responsabilidade ser repassada ao Poder Público.

Uma segunda corrente, encampa o posicionamento de que o artigo 486 da CLT se refere apenas à multa de 40% sobre o saldo do FGTS, não se tratando, portanto, de verbas rescisórias. 

Para uma terceira corrente, é plenamente aplicável o artigo 486 da CLT diante da pandemia do COVID-19, vez que, considerando que a paralisação das atividades empresariais se deu em decorrência de ato da administração pública, não pode o empregador ser responsabilizado pelo pagamento da verbas rescisórias dos empregados demitidos, responsabilizando, pois, o Governo.

Quanto à interpretação de tal previsão legal, é possível citar julgado do Tribunal Superior do Trabalho em que reconhece a seguinte interpretação da norma contida no mencionado artigo: “O dispositivo em exame dispõe in litteris os seguintes requisitos para a responsabilização do ente público: a) paralisação temporária ou definitiva do trabalho; b) motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade. Como se vê, não há de forma expressa a previsão de exceção para a responsabilidade da autoridade pública, sendo a discussão em liça – desapropriação por não cumprimento da função social do imóvel e responsabilidade do empregador – fruto de construção jurisprudencial e interpretação do artigo 486 da CLT. “ (TST AIRR 1770-57.2013.5.03.0036, 4ª turma).

Referido julgado manteve acórdão do Tribunal de origem, onde houve a responsabilização do INCRA, que havia determinado desapropriação de área, porém, limitando-a ao aviso prévio indenizado e a multa de 40% sobre o FGTS (verbas de caráter nitidamente indenizatório, reforçando assim por uma possível aplicação da segunda corrente).

Isso indica, portanto, que a análise em decorrência da pandemia certamente se dará de forma mais ponderada, uma vez que a paralisação das atividades não decorre diretamente e exclusivamente de ato do Estado, posto que é reflexo das medidas proteção contra a propagação do vírus, inclusive, seguindo orientações e diretrizes de órgãos internacionais.

Denota-se, portanto, que o tema é controvertido e polêmico. Sendo assim, o empresário ao adotar qualquer medida no cenário atual deve estar bem assessorado juridicamente para que seja feita uma gestão de risco, levando-se em conta a realidade da empresa e a probabilidade  de um passivo trabalhista.

Colaboração – Sabrina Senechal

Advogada – OAB/SP 414.827

Consultora Jurídica da Área Trabalhista do Escritório Ribeiro & Albuquerque Advogados Associados

 

 

 

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